Por Fábio Marques
Dias de reflexão. Resoluto a não mais escrever crônicas e artigos para a imprensa, isolei-me em minha humilde cabana e procurei assistir televisão nas tardes após o trabalho, em vez das habituais leituras que exercem influência sobre os 10 por cento de minha cabeça-animal. Mas que agonia. Achava que tivesse havido alguma mudança nestes últimos dez anos, desde quando abdiquei de vez a TV como canal de distração. Mas não. A coisa até piorou.
Tudo começa logo após o almoço com os telejornais e as notícias sobre a violência. As testemunhas só aceitam dar entrevistas se suas vozes saírem com aquelas distorções robóticas. Parece que só aceitam depor de for nesta fórmula. Se a gente for analisar a fundo a situação, veremos que o testemunho dado pouco acrescenta em informação à notícia, mas contribui para aumentar ainda mais o clima de insegurança que está tomando conta de todas as cidades. Em suma, as pessoas que dão estes testemunhos estão apavoradas porque estão correndo risco de vida se abrirem a boca e não acreditam mais na proteção da polícia.
Lá pelo meio da tarde, um programa da TV aberta explora ao máximo o chamado “Mundo cane” em todas as suas minúcias, aspectos e nuances. A âncora do programa coloca no coliseu de atuação um ser humano contra outro ser humano para tirarem a limpo suas diferenças ao vivo e a cores para todo o Brasil. São mulheres traídas querendo explicações do marido traidor, são cornos diante das mulheres vagabas, e o principal: moças pedindo o teste de DNA para saber de quem é o filho parido dentre os três ou quatro rapazes que treparam com ela nos últimos meses.
Chegando lá pelas cinco, num outro programa, um helicóptero sobrevoa a maior cidade do País, acompanha lá das alturas alguns assaltos que acontecem e aproveita para ajudar o trânsito. Aqui o papel do âncora é condenar com rigidez as autoridades que nada estão fazendo para controlar a situação caótica do trânsito e também nada estão fazendo para controlar a situação da violência que vem tomando conta desta “pobre metrópole”. Um programa desses era para ser local. Mas não! Este programa é nacional. O que nós que moramos aqui numa aldeota a milhares de quilômetros do epicentro do fato narrado, temos que ver com o trânsito ou a violência de São Paulo? Nada. Mas ainda assim, o ibope deste programa neste horário também é lá nas alturas.
Achava que a coisa havia mudado na televisão em termos de expansão cultural e melhoria na qualidade dos programas. É de se lamentar aquilo que se assiste em certas emissoras. São autênticas barbáries do mundo moderno. São âncoras e jornalistas seguindo uma linha editorial apelativa e fazendo da desgraça alheia um teatro do absurdo. O pior é que entre uma matéria e outra, ainda reclamam pelo social franzindo a testa, olhando o telespectador nos olhos e chamando o governo de inoperante.
Portanto é com enorme alívio e alegria no coração, que retorno às minhas leituras habituais, deixando ao reles abandono a televisão.