Existiam, até então, três espécies de peixe-boi: Trichechus
senegalensis (peixe-boi-africano), o Trichechus manatus (peixe-boi-marinho), e
o Trichechus inunguis (peixe-boi-da-amazônia).
Arcada dentária do Trichechus hesperamazonicus, encontrado em Rondônia — Foto: Journal Of Vertebrate Paleontology |
O trabalho, publicado na revista acadêmica Journal of
Vertebrate Paleontology na última sexta-feira (17), descreve que a nova espécie
de peixe-boi existia na bacia amazônica, mais precisamente no Rio Madeira, em
Rondônia. A região atualmente não comporta mais peixes-bois, por ser um
ambiente de corredeiras e águas rápidas, que não é propício para a espécie.
A publicação apresenta mais uma peça do quebra-cabeça que
pesquisadores locais tentam montar para conhecer o cenário amazônico de
milhares de anos atrás.
Os vestígios do peixe-boi foram encontrados na década de
1990 por garimpeiros que trabalhavam no distrito de Araras, nas proximidades de
Nova Mamoré (RO).
Os garimpeiros entregaram os fósseis à pesquisadores do
Museu da Memória Rondoniense (Mero) e Universidade do Vale do Rio dos Sinos
(Unisinos).
O mapa destaca o garimpo de Araras, em Nova Mamoré (RO), onde os fósseis de Trichechus hesperamazonicus foram encontrados. |
"O da Unisinos era de um garimpeiro que trabalhou por
muito tempo em Rondônia, ele voltou pro Rio Grande do Sul e levou o material
com ele. Depois que ele morreu, a família doou a peça à universidade",
comenta Ednair Nascimento, diretora do Mero.
Mario Alberto Cozzuol e Fernando Perini (veja no vídeo
acima), pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também se
interessaram pela descoberta. O primeiro é especialista em mamíferos fósseis
aquáticos e o outro atua na área de descrição de mamíferos. Ednair se juntou a
eles e começaram a pesquisa, que conta com análise estatística, descrição
anatômica e informações geológicas.
Durante os estudos, a equipe descobriu que os fósseis se
tratavam de nova espécie – já extinta – de peixe-boi. O animal vivia no bioma
amazônico brasileiro no período pleistoceno tardio.
O Trichechus hesperamazonicus é diferente de todas as outras
espécies de peixes-bois por causa da arcada dentária.
"Ele tem os dentes grandes, proporcionalmente maiores
que do peixe-boi-amazônico, semelhantes ao do peixe-boi-africano e marinho. E
ao mesmo tempo o perfil da parte inferior da mandíbula lembra a do
peixei-boi-amazônico. Mas ele também tem diferenças na parte posterior da
mandíbula que não se encontra em nenhum outro peixe-boi fóssil existente",
revelam os pesquisadores em vídeo.
A incomum linha dentária observada pode estar relacionada a
diferenças de mastigação e dieta dos animais.
"O Trichechus hesperamazonicus é consideravelmente
maior do que o peixe-boi-marinho e outro peixe-boi já visto na Amazônia. O
tamanho do crânio se aproxima das medições do peixe-boi-africano", diz a
pesquisa, em tradução livre.
O peixe-boi-africano, citado como parâmetro de medição,
chega a 450 kg em idade adulta e pode medir até 3,5 metros.
Uma das hipóteses levantadas na pesquisa é que o mar é a
origem do peixe-boi amazônico. "Há aproximadamente 5 milhões de anos, o
Oceano Pacífico entrava na Amazônia. Com o soerguimento das Cordilheiras dos
Andes muitos animais ficaram presos aqui, como por exemplo, esses
Trichechus", explica Ednair Nascimento.
"Ainda está para ser determinado se o Trichechus
evoluiu inicialmente em habitats ribeirinhos e depois invadiu ambientes
marinhos. Ou se o peixe-boi de água doce é resultado de uma invasão de habitats
costeiros", consta no artigo (tradução livre).
Onde estão?
Os fósseis do Trichechus amazonicos estão atualmente na
UFMG, mas a previsão é que retornem para Rondônia em fevereiro. Ele será
exposto no Museu da Memória Rondoniense, onde toda a população poderá
contemplar a nova espécie de peixe-boi-amazônico.
"Há todo um protocolo de envio. É um material frágil e
não pode ser simplesmente enviado via correio. Então um pesquisador é que vai
trazê-lo no mês que vem. Já estamos na tratativa para que esse material
retorne. O tombamento especifica que ele pertence ao Museu da Memória
Rondoniense", diz Ednair Nascimento.
Orgulho local
O artigo é visto com grande satisfação por pesquisadores do
estado, como comenta Glenda Félix, arqueóloga da Universidade Federal de
Rondônia (Unir).
Para ela, os intercâmbios científicos que ocorrem entre
várias instituições de pesquisa fazem com que a Região Norte ganhe prestígio no
exterior.
Fonte: G1
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