Por Fábio Marques
Perdera o encanto com a vida. Ilusões com amores, paixões ardentes, sonhos frustrados. Acabou jogando a toalha depois que começou a sentir que nada mais havia sentido tanto para aquilo que era como para aquilo que fazia. Queimara os fusíveis a vida inteira. Agora estava queimando os motores. Estava prestes a acabar com tudo. Inclusive com a própria vida.
Quando pequeno, o desejo de seu genitor que muito lhe amava era de que se formasse em Direito. Quando lhe sugeria esta profissão, ficava calado porque não tinha coragem de lhe contrariar ou ainda de lhe desgostar. Mas nunca se animou com a ideia de um dia ser obrigado a convencer jurados de que o acusado era inocente. Não gostava de convencer ninguém.
Portanto, Direito Público jamais seria o seu destino. Na contramão, como era muito chegado à leitura, resolveu capinar num outro terreno. Trabalhar com notícias. Com o incentivo de uma amiga que respondia por um antigo gráfico, cumprindo sua vocação, começou a ensaiar a confecção de artigos para o impresso.
No ramo da escrita descobriu pessoas que jamais sairão de suas lembranças. Descobriu também a paz das altas horas noturnas. Conversou com as melhores cabeças pensantes e com os melhores bêbados da cidade. Discutiu filosofias, políticas e lutas ao redor de suadas cervejas ao som das melhores melodias tocadas e cantadas pelos melhores amigos do violão e trabalhou novas matérias através de rascunhos antigos.
Por toda esta época vivenciou momentos gloriosos e amargos. Corrigiu textos para colegas da imprensa, assistiu outros colegas deixarem a profissão para se dedicar a outros ramos de ocupação por questão de melhores ganhos de vida, conduziu ainda outros colegas para o descanso eterno na última morada e adentrou o serviço público primeiro em cargo de comissão como Relações Públicas e a posteriori através de concurso.
Desde a adolescência escrevia coisas mundanas que guardava para si. Reflexões, medos, receios, aflições, coragens e impulsos. Seus artigos para os jornais quase sempre causavam fúrias grotescas e ódios irracionais nos leitores que não pactuavam com suas ideias que passavam a destrata-lo com ofensas. Não estava nem aí. Ora! Os leitores que mais nos agridem também são aqueles que mais nos devoram.
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Estava solteiro já passado algum tempo. Gostava de estar solteiro. Não gostava de namorar apenas por namorar. Apenas por estar ficando com alguém. Depois dos cinquenta, acaba-se ficando mais rígido na seleção do mulherio. Da relação que mais apostou na vida ficaram sobrando fragmentos, resíduos, lembranças amargas. Tivera relações com outras mulheres. Sobreviveu a todas, mas nunca mais conseguiu se encontrar. Todas tinham os mesmo defeitos, mas nenhuma seria como aquela que marcara sua vida.
Morava a 50 metros da praça principal. Possuía uma paixão platônica por uma linda milady que atuava como gerente de uma loja de produtos agroindustriais. Todos os domingos no horário do Fantástico aparecia numa pizzaria situada no espaço a fim de avistar a distância sua paixão secreta e degustar a saideira do final de semana.