Paz eleito em segundo turno: "É com amor que se resolve a pátria, não com ódio ou divisões."
Um recorde. Paz Pereira conquistou a presidência na primeira tentativa. Todos os seus antecessores superaram vários fracassos.
Rodrigo Paz, presidente eleito |
Em 19 de outubro de 2025, poucos minutos depois das 20h, o Tribunal Supremo Eleitoral anunciou os resultados preliminares do segundo turno das eleições gerais. Naquele momento, Paz Pereira se tornou o primeiro cidadão boliviano a vencer a presidência em um segundo turno. Não apenas isso: ele também marcou outro marco, tornando-se o primeiro político a triunfar esmagadoramente em sua primeira candidatura presidencial.
E foi na noite de 19 de outubro que ele proferiu seu primeiro discurso como presidente eleito. Ele o fez cercado por sua família e pelos líderes do PDC, mas na ausência de Edmand Lara, seu companheiro de chapa. Ele agradeceu a diversos líderes pelos telefonemas de felicitação, elogiou o trabalho realizado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e lamentou que a guerra suja tenha prejudicado a campanha eleitoral.
Durante grande parte do século XX, e mesmo no início do século XXI, os presidentes não eram eleitos por maioria popular direta, mas por uma Assembleia fragmentada que atuava como árbitro e plataforma. Desde o retorno da democracia em 1982, nenhuma eleição geral obteve maioria absoluta. Candidatos venceram nas ruas, mas perderam nas urnas. Alianças decidiram o que o voto não pôde decidir.
Víctor Paz Estenssoro retornou ao poder em 1985 não pela magnitude de sua vitória, mas por um pacto com seus adversários. Ele deteve a hiperinflação ao custo de um ajuste econômico traumático. Em 1989, um acordo ainda mais inusitado entre Banzer e Jaime Paz Zamora — que terminou em segundo lugar nas urnas — levou o líder do MIR à presidência, em meio a negociações que misturaram poder, conveniência e até mesmo reconciliaram inimizades à força. A democracia boliviana sobreviveu em meio a rumores de pactos e à desconfiança do povo.
Essa fórmula se repetiu inúmeras vezes. Em 1993, Gonzalo Sánchez de Lozada selou uma aliança com o MBL; em 1997, foi a vez de Hugo Banzer, apoiado por setores empresariais e partidos menores; em 2002, a história beirava o absurdo: o Congresso elegeu Sánchez de Lozada em detrimento de Evo Morales, apesar da diferença mínima de votos.
Um segundo turno eleitoral nunca havia sido realizado antes. Em 2009, Evo Morales venceu com 64,22% dos votos e, em 2014, venceu com 61,36%. Em 2019, parecia que a Bolívia iniciaria um segundo turno entre Morales e Carlos Mesa. De fato, dados oficiais do Tribunal Supremo Eleitoral, por meio do TREP (Investigação e Avaliação do Tribunal Eleitoral), abriram essa possibilidade. Mas tudo mudou após uma queda de energia e um silêncio ensurdecedor de 24 horas, durante o qual as tendências mudaram e tentou-se impor uma vitória apertada ao líder do MAS, evitando um segundo turno.
A história de 2019 é bem conhecida. Ninguém acreditava no milagre eleitoral. Ninguém admitia que, em questão de horas, centenas de milhares de votos chegaram, eliminando efetivamente a possibilidade de um segundo turno. Até mesmo as missões de observação eleitoral da OEA e da União Europeia expressaram dúvidas sobre o resultado, dúvidas que levaram a manifestações de rua e a um motim policial que forçou a renúncia de Evo Morales e Álvaro García Linera como presidente e vice-presidente.
Víctor Paz Estenssoro retornou ao poder em 1985 não pela magnitude de sua vitória, mas por um pacto com seus adversários. Ele deteve a hiperinflação ao custo de um ajuste econômico traumático. Em 1989, um acordo ainda mais inusitado entre Banzer e Jaime Paz Zamora — que terminou em segundo lugar nas urnas — levou o líder do MIR à presidência, em meio a negociações que misturaram poder, conveniência e até mesmo reconciliaram inimizades à força. A democracia boliviana sobreviveu em meio a rumores de pactos e à desconfiança do povo.
Essa fórmula se repetiu inúmeras vezes. Em 1993, Gonzalo Sánchez de Lozada selou uma aliança com o MBL; em 1997, foi a vez de Hugo Banzer, apoiado por setores empresariais e partidos menores; em 2002, a história beirava o absurdo: o Congresso elegeu Sánchez de Lozada em detrimento de Evo Morales, apesar da diferença mínima de votos.
Cada decisão parlamentar refletia o equilíbrio de poder, não a vontade do povo. Nos cafés de La Paz e nos mercados de Santa Cruz, falava-se de "negócios" em vez de programas. A política era uma plataforma de negociação para ministérios, embaixadas e privilégios. O sangue derramado em outubro de 2003, durante a chamada "guerra do gás", também foi o preço dessa desconexão entre o voto popular e o poder real.
2005 quebrou esse ciclo. Evo Morales Ayma venceu com 53,74% dos votos, a primeira maioria absoluta desde 1982. O Congresso não precisava mais decidir. A história política do país mudou em um único dia. Com Morales, uma nova era começou: a do voto esmagador e do Estado Plurinacional, selada em 2009 com uma Constituição que, entre muitas mudanças, estabeleceu o segundo turno presidencial como garantia de legitimidade.
2005 quebrou esse ciclo. Evo Morales Ayma venceu com 53,74% dos votos, a primeira maioria absoluta desde 1982. O Congresso não precisava mais decidir. A história política do país mudou em um único dia. Com Morales, uma nova era começou: a do voto esmagador e do Estado Plurinacional, selada em 2009 com uma Constituição que, entre muitas mudanças, estabeleceu o segundo turno presidencial como garantia de legitimidade.
O paradoxo da história boliviana foi que essa ferramenta — o segundo turno — levou dezesseis anos para ser implementada. Nem em 2009, nem em 2014, nem mesmo no controverso 2019, um segundo turno foi necessário. Evo Morales venceu duas vezes com mais de 60% dos votos, e Luis Arce o fez em 2020 com 55%. Somente em 2025, após uma fragmentação do voto e uma reestruturação do mapa político, o país se viu diante de seu primeiro segundo turno. As regras haviam sido escritas anos antes, mas só agora foram postas à prova. A democracia, como os velhos relógios do Palácio Legislativo, começou a marcar seu tempo exato.
A vitória de Rodrigo Paz Pereira marca, portanto, uma nova virada na história política da Bolívia. Não foi apenas uma eleição acirrada, mas o encerramento de uma era. Pela primeira vez, o segundo turno serviu para determinar uma liderança com total legitimidade, sem acordos de bastidores ou congressistas decidindo pela maioria. A cidadania era, em última análise, o único árbitro.
O dia 19 de outubro de 2025 permanecerá na memória nacional como o dia em que a Bolívia completou sua transição de uma república negociada para uma democracia majoritária. Não houve épico militar nem discursos grandiloquentes, apenas a rotina austera de um país que aprendeu — após séculos de instabilidade — que o poder legítimo nasce da vontade do povo.
Ontem à noite, quando os resultados oficiais foram anunciados e Rodrigo Paz se declarou presidente eleito do Estado Plurinacional, a Bolívia escreveu uma página sem precedentes em sua história democrática: aquela em que o poder é finalmente conquistado com o voto limpo, direto e soberano de seu povo.
Ontem à noite, quando os resultados oficiais foram anunciados e Rodrigo Paz se declarou presidente eleito do Estado Plurinacional, a Bolívia escreveu uma página sem precedentes em sua história democrática: aquela em que o poder é finalmente conquistado com o voto limpo, direto e soberano de seu povo.