Por Fábio Marques
Cansado de tantos “casas e separas”, o poeta decidiu que aquilo não
era vida para ser vivida. Apesar de estar morando sob o mesmo telhado
que Lady Mclaine, não tinham relações afetivas, de alma e nem sexuais.
Aparência. Aparência elevada à potencia máxima. A vivência da morte no
cotidiano da vida. Esta situação o afligia. Acordava no meio da noite
afogado em angústia e chorava baixinho para não incomodar quem estava
dormindo.
Como viver com uma pessoa quando já não existe amor? O
casamento sem amor não é casamento. A relação sem amor acaba com os
diálogos. E sem diálogo não há harmonia. Apenas más vibrações. Os
vínculos tornam-se apenas questão de sobrevivência. Este era o retrato
falado da vida do poeta nos últimos tempos. Se ajudavam um ao outro por
decreto. Aqui e acolá até tentavam uma reconciliação, mesmo sabendo que
as coisas haviam chegado a tal ponto que qualquer esforço neste sentido
não iria trazer nenhum resultado prático.
Certa noite achava-se
tomando uma cerveja num boteco ao qual era habitué quando de repente uma
antiga paixonite de adolescência adentrou o ambiente. Soraya Sayonara,
apesar de seus 45 anos e três casamentos nas costas, mantinha-se bonita e
elegante como nos tempos de colégio quando quase tiveram um romance.
Seus olhares se cruzaram, trocaram acenos e sorrisos e logo estavam
sentados à mesma mesa botando as conversas em dias e lembrando de
encantos e nostalgias.
Um homem e uma mulher. Ambos maduros.
Ambos com seus problemas e carências. Ambos à procura de algo que
preencha suas vidas com amor, carinho, desejos e múltiplas
responsabilidades. A noite era pequena. Entre uma cerveja e outra no
meio da conversa, uma cantada.
Explicação intencional para
algumas senhoras metidas a bestas (Algumas até com curso superior) que
por qualquer cantada, estão entrando com processo contra os “casanovas”
de Guajará-Mirim. Cantada não é assédio. Cantada é um elogio elevado à
última potência da equação. E toda mulher normal gosta. É a manifestação
de uma fantasia. Um convite que se dirige à qualquer mulher sem a
pretensão de ser bem sucedido. Ao contrário do assédio, que é a fissura,
a carência em estado bruto, a falta total de simancol. Recado dado.
O poeta tinha em seu acervo cerebral algumas receitas mágicas de amor
que começou a desfilá-las assim que Soraya Sayonara retornou da toalete:
“Você tem beleza, classe, distinção... tudo isso e mais uma
feminilidade que transborda. Eu chego a sentir ela fervendo dentro de
você”. E mais adiante: “ Você é o reflexo da imagem que vive nos meus
sonhos desde aquela época. O espelho dos meus desejos secretos. A face
que eu desejo mostrar ao mundo”. E rematou: “Já temos idade bastante
para fazer nossos próprios planos, tomar nossas próprias decisões e até
cometer nossos próprios erros, se for preciso. O que sinto por você vem
do fundo da alma, não é uma obrigação imposta”.
Acabaram a noite
no Motel Princesa Isabel, onde impera a lei do ventre livre. Transaram e
curtiram seus corpos adoidados. No êxtase do relax até fizeram juras e
promessas de amor eterno.
A verdade é que após este evento, nunca
mais voltaram a se encontrar. Não importa. O fato que releva a história
é que o poeta vingara-se do desprezo, abandono e desamor de Lady
Mclaine.